Importância de ter um Atuário na Mensuração dos Riscos dos Passivos Atuariais

28.12.2023 - Fonte: Revista Brasileira de Atuária | EDER OLIVEIRA

SEGURO-GAUCHO (24)

Abaixo, leia artigo assinado por EDER OLIVEIRA, SÓCIO DIRETOR DA ATUÁRIA BRASIL.

O mundo tem evoluído a passos largos em recursos técnicos, cujo progresso em todos os segmentos profissionais tem sido muito rápido. Um tsunami de inovações por todos os lados, inteligência artificial e uma série de novidades a cada dia, e nós, profissionais da área atuarial, estamos embarcados nesta realidade. Ouvimos falar em disrupção, que significa “a quebra ou descontinuação de um processo já estabelecido”, disrupção tecnológica definida como “a mudança radical provocada pelo surgimento de uma nova tecnologia”, e por aí afora.

Outro dia ouvi a seguinte questão: “Será que após a pandemia (Covid-19) não estamos vivendo o Ano 1 de uma Nova Era”? Penso que não conseguiremos tomar este ponto como uma verdade, mas caminhando lado a lado com a inovação, é facilmente perceptível que as pessoas e suas relações também vêm mudando, especialmente tratando-se de inclusão social, ambiguidades políticas e tudo mais que estamos assistindo.

De fato, tudo mudou e está mudando de modo acelerado, mas para nós, atuários, há uma verdade absoluta que não se altera, acompanha-nos por décadas e que norteia a nossa jornada acima de qualquer outro objetivo profissional: zelar pela solvência técnica das companhias (empresas ou entidades) nas quais operamos, desafio cada vez mais presente em nosso dia a dia, agora dentro deste novo cenário “online” que o mundo nos entrega, onde tudo é para “agora”.

Esta tarefa exige dos atuários uma visão em “3D” acerca do que acontece “em cada canto” das empresas, antevendo possibilidades, calculando provisões técnicas e capitais de riscos sentindo os “batimentos cardíacos” do “cliente”, enfim, checando ponto a ponto, mês a mês, os riscos que batem à porta a todo momento. Trabalhamos com a Ciência Atuarial, que concilia métodos matemáticos/estatísticos aplicados aos contratos cujo objeto é a transferência de risco, designando ao atuário a tarefa de traduzir estes riscos, continuamente modificados pelas transformações sociais (hábitos, costumes, valores, etc.), em equações matemáticas. Dentro deste compromisso profissional de entender, mensurar e quantificar riscos, podemos afirmar que um dos mais severos, presente no âmago das empresas que atuamos, se encontra no contencioso judiciário, envolvendo especialmente as demandas com sinistros e seus respectivos passivos atuariais.

Cada processo judicial possui um risco a ele atrelado, seja com elevada probabilidade de perda ou não, mas todos, invariavelmente, possuem seu risco de perda e, consequentemente, de desembolso financeiro. Daí decorre a necessidade de que esses processos estejam adequadamente provisionados pelo seu atuário. São demandas que envolvem desde discussões simples, cujo risco é menor, até processos mais complexos, que permitem provisões atuariais de alta monta, conforme o modelo presente na Nota Técnica Atuarial para registro da Provisão de Sinistros Ocorridos e Não Avisados (IBNR) e, principalmente, da Provisão de Sinistros a Liquidar (PSL).

A questão é que, independentemente da metodologia deste provisionamento, o risco é latente e está presente em cada processo judicial; logo, quanto mais científico for o modelo de cálculo das provisões atuariais, mais próximo estará de se obter um equilíbrio neste cenário, evitando, assim, surpresas com elevados desembolsos financeiros não esperados (não provisionados adequadamente), que, por vezes, podem ameaçar os níveis de solvência técnica da empresa, situação que, apesar de parecer difícil quando lidamos com os riscos das ações judiciais, dependendo de seu contexto e do tamanho da empresa, pode não ser tão difícil assim.

O acompanhamento constante que o atuário faz do ambiente judicial, sob o crivo de sua especialidade, possibilita proceder a análises bem mais aprofundadas da matéria. Esse processo vai além da mensuração do passivo específico e pode chegar, conforme o caso, ao ponto de avaliar o nível de risco de cada grupo de ações judiciais segundo o seu objeto. Através deste tipo de análise, é possível adentrar nos reflexos destes riscos em relação ao equilíbrio financeiro e econômico da entidade, envolvendo o tripé provisões técnicas, capitais e solvência, além de desenvolver metodologias que podem simplificar as rotinas operacionais e permitir maior tranquilidade para as áreas jurídica e de sinistros. E o atuário pode avançar ainda mais, pois seus estudos possibilitam indicar a revisão de determinado produto de seguro e/ou de previdência em relação ao ajuste de taxas e/ou revisão das condições gerais, visando mitigar a ocorrência de surpresas já mencionadas.

Dentre os modelos para provisionamento atuarial, podemos elencar aqueles que dividem seu estoque de ações por probabilidade de perda, ou seja, riscos de perdas prováveis, possíveis e remotas, cuja classificação provém dos advogados. O saldo da provisão é a resultante da aplicação de percentuais (mais ou menos agravados conforme a probabilidade de perda) sobre o valor da causa, da cobertura e/ou da estimativa de perda calculada. Conforme o caso, podemos utilizar modelos mais científicos, que buscam premissas para provisionamento extraídas do que se observou em todo o estoque de ações encerradas, retroagindo a um lapso de tempo pretérito (maior intervalo de tempo possível). Além do objeto, é possível segregar a classificação de perda de cada ação, buscando encontrar, por meio de modelos estatísticos, premissas mais realistas para um provisionamento assertivo, que permitam alcançar maior segurança técnica e proporcionem uma gestão direcionada ao equilíbrio técnico e financeiro da empresa.

Por outro lado, depois da conquista assegurada por Recurso Repetitivo do STJ, que reconhece a imprescindibilidade de realizarse perícia atuarial nos feitos da previdência complementar fechada, uma outra e fundamental ação, que qualifica o desenvolvimento dos processos judiciais, é a participação do atuário como perito assistente das ações técnicas das entidades. Na prática, vemos que muitos processos chegam para elaboração de perícia ou mesmo para a decisão do Magistrado sem terem sido elucidados com maior precisão os pontos atuariais básicos acerca do equilíbrio (ou outros pontos específicos), ou mesmo sem que a entidade junte um parecer atuarial esclarecedor sobre o que se discute. No caso de o Juiz confirmar a necessidade de perícia judicial e nomear o perito para o trabalho, os quesitos precisam ser elaborados em uma sequência lógica, direcionada ao entendimento da tese pelo Magistrado, tarefa que é altamente técnica, onde o atuário vai evidenciar os pontos com maior precisão, juntamente com a expertise do advogado, o que vai lhe permitir estimar os prováveis passivos oriundos destas ações, considerando as probabilidades de perda, culminando em um provisionamento mais assertivo ao respectivo risco pela entidade.

Por fim, com a crescente judicialização de pleitos, o volume de processos que envolvem os setores que trabalham com risco e concorrem para o exame massivo e perfunctório das demandas pelo Judiciário, a área jurídica das empresas ou mesmo o profissional do direito não estão habilitados a aferir esse risco com a precisão técnica requerida, ainda que orientados por metódico e detalhado manual para preenchimento da análise do potencial de derrota contido em cada demanda judicial, com repercussão direta na formação da garantia. É justamente em relação à especialidade técnica privativa do atuário que cabe atuar no âmbito de um segmento que tem na base de seus pilares o elemento solvência, transitando em um ambiente de supervisão baseada em riscos e de elevado nível de inovação e agilidade.

Sendo assim, considerando a expertise de antever possibilidades e mitigar os riscos atuariais presentes nestas demandas, certamente o profissional atuário vai entregar mais segurança aos gestores das empresas.

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